terça-feira, 29 de abril de 2014

A razão do culto a Egungun.


Homenagem ao Babalorsá José Carlos (Wure baba).

É muito fácil descrever as razões por que cultuar Egungun, o culto aos antepassados é bastante conhecido e divulgado em praticamente todos os seguimentos religiosos.
Sempre que você citar feitos de um antepassado você esta mantendo viva a memoria de pessoas que você admira, a divulgação mantem vivo o personagem citado, e estimula aqueles que concordam a perpetuação dos fatos. O divulgar não deixa de ser uma forma de culto, você cita quem admira e divulga quem o seu respeito merece.

A memoria da humanidade é o maior patrimônio e o mais enriquecedor legado do ser humano, imagine todas as criações de nossos antepassados e o seus usos no dia a dia, seria muito difícil viver sem esse legado.

No grupo familiar e no seguimento religioso isso é naturalmente enfatizado com cantigas e historias que homenageiam os orisas, as cantigas os gestos nas coreografias das danças nada mais são que um culto a antepassados, as pessoas não consegue entender que tudo isso é culto a Egungun.

O patriarca do povo Yoruba Odudua foi o primeiro a ter culto como antepassado em nossa cultura religiosa, esse inicio foi marcado pela necessidade da divulgação dos feitos desse grande guerreiro, um monarca inteligente e corajoso que expandiu o seu império.

Depois de Odudua outros personagens deram seguimento aos feitos dos lideres yorubas imortalizando assim esses grandes lideres, esses fatos enchem de orgulho seus descendentes.

O culto a Egungun e aos antepassados divinizados se é que podemos dizer assim sobreviveu em nosso país graças ao esforço daqueles que foram trazidos para cá como escravos, talvez por esse fato o reconhecimento a essa cultura não tenha sido aquele esperado.

A verdade é translucida se não fosse os feitos dos nossos antepassados, certamente não existiriam descendentes para contar a historia.

Em um isan a representação das nove gerações unidas além de fortalecer o elo de ligação com os antepassados à energia contida aguça a memoria do descendente assumindo o compromisso da perpetuação.

É evidente que uma pessoa de má índole não merece o respeito dos seus descendentes após a sua morte, sendo assim o culto a Egungun é marcado por uma severa seleção de caráter e postura impar daquele a ser cultuado.

O fato de envelhecer não implica em receber respeito, os canalhas também envelhece, é verdade que a idade avançada trás a experiência como testemunha, mas não habilitam o individuo a receber considerações diferenciadas, sendo assim não são somente pessoas que morrem com muita idade que merecem culto após a sua morte.
O respeito deve ser mantido pelos espíritos dos antepassados, mas também pelos espíritos dos descendentes que cedo nos deixaram o culto a Egungun é cheio de segredos e dentro dele existem inúmeras subdivisões.

Quando cultuamos Egungun a energia é a de um culto a uma divindade que tem como razão primeira manter viva a nossa memória estabelecendo ligação entre o passado e o presente, harmonizando os conflitos pessoais e familiares entre gerações, criando assim um resgate por que no culto a orisá nada é imutável e a ultima palavra pertence à Olodumare.

Quando vejo lagrimas de saudades nos olhos dos descendentes que se entristecem pela ausência de seus antepassados examino cuidadosamente o teor dessa emoção e traduzo isso como a agua que alimenta a terra e faz florescer a semente da eternidade. Todo aquele que é amado se torna imortal no coração de quem o ama.

O grande sonho e talvez a mais difícil missão do ser humano é ser lembrado após a sua morte por suas ações. Inspirar os descendentes com seus atos é viver eternamente, é ter a certeza que você estava no caminho certo. A alegria de saber que tudo que você fez é exemplo para aqueles seguem a sua orientação, trás para o espirito do antepassado a certeza que ele esta presente entre os seus descendentes.

Um grande sacerdote nunca vai morrer.

Babalawo Ifagbaiyin Agboola.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

IR E VIR



CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens.

Gostaria de convidar os meus amigos para refletir sobre o artigo 5º da constituição do nosso país, é interessante que alguns líderes religiosos não percebam que é necessário cumprir a lei para desenvolver trabalho apreciável.

Se você não permite que um iniciado em sua casa se afaste ou que ele busque outra casa para consultar algo não esta bem, a pessoa deve ter liberdade para sair pela mesma porta que entrou, não conheço nenhum verso de ifá que obrigue um iniciado a seguir seu iniciador em caso de não haver mais um relacionamento equilibrado.

Se os nossos filhos que acompanhamos desde antes do nascimento não somos proprietários, o que dizer de “filhos” de religião?

Essas pessoas que muitas vezes nos procuram em um momento difícil de suas vidas, tem uma forma própria de ver a vida e a religião, então como vamos controla-las?

É impossível, é inadequado e sem sentido.

Muitas vezes alguém que chegou a sua casa desempregado e que agora esta em uma situação financeira privilegiada muda completamente o foco, a pedida já não é mais a mesma e deixamos de ser útil, a pergunta é temos o direito de impedir essa mudança?

Conheci muitos jovens que entraram na religião porque queriam uma namorada ou ser aprovado no vestibular, hoje são ótimos profissionais e esqueceram os orisás e as pessoas que os iniciaram, será que isso motiva para uma vingança?

Não vejo com bons olhos as pessoas que se afastam das casas que os serviram e saem falando mal de seus sacerdotes, assim como abomino as historias de alguns sacerdotes fazendo alusão a detalhes da vida intima de alguém por ele iniciado.

Se a louça rachou não é necessário quebrar o restante, você pode colar e usar de outra forma bem diferente, porque o amigo íntimo de ontem deve ser o inimigo de amanha?

Coisas da relação humana que de forma desumana presenciamos no dia a dia, o homem virar animal e considerar que se você não esta a favor dele certamente esta contra, esquece ele que o ar que ele respira não tem proprietário e o mesmo sol que o ilumina pode queimar a pela de outra pessoa.

A verdade é que é muito duro você vê que seu filho está adulto e que começa a tomar decisões sem pedir a sua opinião, se isso acontece em nossas casas porque não aconteceria nas casas de religião, temos que saber entender as necessidades das pessoas, elas mudam como muda o vento.

Uma pessoa que tenha um problema afetivo hoje e que todo dia me procurar para se lamentar se iniciada no orisa certo pode viver um grande amor para toda vida, porque ela iria continuar se lamentando se esta feliz, o entender é parte do querer bem, o compreender é irmão gêmeo da aceitação, sem aceitação não existe entendimento.

Há muitos anos, em uma conversa com mãe Edelsuita, comentei com ela que algumas pessoas tinham saído de minha casa, ela calmamente me disse meu filho somos como postos de gasolina as pessoas chegam com o tanque vazio, abastecem e segue a viagem, em um primeiro momento a frase me chocou, hoje tenho certeza que tudo que ela me disse esta certo.

Soube que em alguns lugares as pessoas pedem uma importância em dinheiro para entregar os orisás que elas receberam para assentar, se a pessoa não deve nada, porque ela teria que pagar para ser liberada, será que isso é uma indenização para o ego do sacerdote, será que esse dinheiro consegue afastar a tristeza de quem se vê sozinho?

A solidão é um monstro cruel que quando domesticado serve para fortalecer o pensar, ampliar o querer e apurar o sentir.

Resta aprender a viver com lembranças, mas com esperanças renovadas, quem viver no passado se atrapalha com o presente, mas quem esquece as experiências comete os mesmos erros, viver é se equilibrar, entre o querer e o poder.

Se você apertar muito o pássaro entre as suas mãos nunca sentira a alegria de ver o seu voo.


  “Filho é um ser que Deus nos emprestou para um curso intensivo de como amar alguém além de nós mesmos, de como mudar nossos piores defeitos para darmos os melhores exemplos e de aprendermos a ter coragem. Isso mesmo! Ser mãe é o maior ato de coragem que alguém pode ter, porque é se expor a todo tipo de dor, principalmente da incerteza de estar agindo corretamente e do medo de perder algo tão amado.”

José Saramago