sábado, 14 de março de 2015

A guerra santa e o Ifá.



Autor: Babalawo Ifagbaiyin Agboola


Em visita recente à Salvador acompanhado de alguns membros de nossa família fui conhecer a feira de São Joaquim, local esse onde os membros dos cultos aos orixás costumam comprar folhas, cerâmicas, roupas e animais para os ritos. Empolgado com o passeio desfrutando das belezas da cidade, cheguei a feira e me assustei com o que eu ouvi, existia lá um serviço de auto falantes, onde um pastor pregava vigorosamente e insistentemente a palavra de cristo.

Para mim não foi surpresa o fato de assistir coisas semelhantes em vários lugares, o que me espantou foi que vários adeptos ao culto dos orixás faziam compra naquele momento e a impressão que tive foi que eles aceitavam com naturalidade.

 Refleti durante algum tempo sobre a questão considerando o fato que alguns sacerdotes de nossa religião ainda levam os iniciados para assistir missa na igreja católica, e a conclusão foi evidente mas difícil de aceitar.

Em um país que os líderes políticos estiveram envolvidos em roubos e assassinatos, sempre que nos defrontamos com alguma irregularidade, o trabalho das autoridades é tão ineficiente que gera uma sensação de vazio desmotivando a denúncia.

Atitudes como a do sujeito que cobra uma exorbitância por um ritual que ele alega ter aprendido com o pai, que aprendeu com o avô, etc., muitas vezes evidenciando a má fé, caracterizando claramente ritos que ele mesmo criou, substituindo o conhecimento pela criatividade, nos dias de hoje são bastante comuns.

  Para responsabilizar as pessoas em questão teríamos que fazer uma sessão espirita para ouvir todos seus antepassados punindo assim em efeito dominó o antepassado ilustre que não detinha o conhecimento mas que delegou ao descendente o mérito de administrar a insegurança sobre os fatos.
Sendo assim de posse de uma informação nada confiável o audaz vende o segredo familiar por um preço fora da realidade construindo assim uma imagem que detém um conhecimento inigualável que somente nesta ocasião será divulgado, originando o crime.

O cenário está pronto e o sacerdote nesse momento em ponto de destaque usa e abusa da oportunidade criando assim uma forma de se beneficiar sem ter responsabilidade com o que está sendo feito, atribuindo a responsabilidade e a origem do então conhecimento a um antepassado que normalmente é descrito como um grande sábio que veio da África.

Quando não é o antepassado responsável pelos atos é os espíritos incorporados que orientam os ritos, gerando assim a impunidade daquele que deveria a ser o único a ser punido.

Perante a lei tudo que o sacerdote aprende com seus antepassados ou na internet ou até mesmo em apostilas é de responsabilidade dele. Ninguém pode ser responsabilizado por algo que não teve participação, os ritos seguem por responsabilidade do oficiante, alegar responsabilidade de terceiros ou coautoria de um espírito é visto pelas autoridades, como um atalho para a impunidade que quase sempre denuncia o autor.

O fato é que um alto preço foi pago, a responsabilidade termina não sendo apurados na maioria dos casos, e na pratica todos perdemos, a não apuração de muitos ilícitos, na fé, é objeto cortante que retalha a nossa imagem.

A imagem do culto aos orixás no Brasil todo dia é prejudicada por alguém que se não é ignorante é desonesto, na grande maioria das vezes pessoas despreparadas dizem ter um conhecimento que não possuem ou terminam agindo com uma postura inadequada, mas a questão é para quem denunciar?

Na igreja católica aconteceu centenas de casos de sacerdotes que abusaram sexualmente de crianças e jovens adolescentes, em nossa religião, será que as denúncias não seguem em frente por não existir a possibilidade de receber uma indenização, ou seria vergonha das vítimas?

Caso como o que eu denunciei de um suposto sacerdote de Iya mi, em Santa Catarina, na cidade de Palhoça, conhecido como Oso, que faz sexo com todas as iniciadas, até hoje não foi apurado.

Em nossa religião esses casos fazem parte da página policial, mas com indícios estranhos, parece que existe uma estratégia para desestabilizar a imagem dos nossos sacerdotes.

A pergunta é quem se beneficia com essas notícias?

Aqueles que querem proibir o sacrifício de animais!

 Aqueles que lavam milhões de reais do crime organizado em suas igrejas!

A multiplicação das igrejas que nos atacam diariamente alimenta a GUERRA SANTA que acontece contra o culto dos orixás, em gabinetes, com um cheiro insuportável de corrupção, bispos evangélicos que tem milhões de dólares depositados no exterior em suas contas bancarias, agora deputados a serviço do crime, agridem Babalorisas e Iyalorisas, que em grande maioria não tem percepção de tudo que está acontecendo.

A falta de lideranças competentes estimula a desunião gerando um andar sem rumo de nossos sacerdotes, a luta contra o poder aquisitivo que mantem emissoras de TV nos atacando violentamente é desigual, os nossos desafetos se alimentam não de passagens bíblicas para nos atacar e sim de nossas próprias falhas.

É chegado o momento de pegar em armas, armas fortes como a verdade e a honestidade, o conhecimento nos fortalece e o conhecimento nos dá segurança, a verdade nos ilumina e a honestidade nos dá liberdade para agir.

Vamos lutar para manter a nossa fé e os nossos costumes, vamos lutar a GUERRA SANTA, mesmo que para isso tenhamos que cortar a própria carne.

Esse texto  é uma homenagem a grande líder religiosa, Maria Stella de Azevedo Santos, (mãe Stella de Oxóssi) do Ile Asé  Òpó Àfonjá, que luta em defesa da nossa fé com sabedoria e dignidade desde 19 de março de 1976.